quarta-feira, 13 de novembro de 2013

desencruzilhada

por todos os lados
só vejo caminhos

segunda-feira, 9 de setembro de 2013

irreal idade

não li os clássicos mas acho foda! o tipo de coisa que não se faz mais - ninguém lê tanto, imagina escrever o problema é seu ritmo ultrapassado já que a calma virou tédio e o tédio tem pressa! 5 segundo pra carregar uma página dedos frenéticos na touchscreen e os olhos que desaprenderam a encarar - que que é? - nada… olhos nos olhos a sirene vibratória nos salva do contato estamos todos conectados a mesma linha do tempo linkamos, curtimos, compartilhamos a rede não nos poupa dos laços 57 amigos em comum Fulano está solteiro Maria foi pro Recife Ricky se sente feliz na fila da balada a fila pra entrar na fila da fila o último lançamento conecta à velocidade da luz e demora quilômetros de luzes vermelhas pra chegar estamos juntos mãos dadas na rua mãos brincando no quarto medindo cada dedo pelo outro horas a fio mas se o Facebook não diz será verdade? a realidade se tornou inverossímil luta pra sobreviver sufocada pela maquiagem um ajuste #aqui, um filtro ali bem mais real! adoro minha vida no altar virtual minha imagem no topo emoldurada igual a todas as outras até plano de fundo merece a moldura dos meus dias pele, brisa, barulhos mesclados, cheiros citadinos essa não se enxerga deve ser irreal como a calma dos velhos que já são batidas frenéticas no banco de espera - aguarde um instante, você já vai viver como jamais imaginou! e se não gostar, pode trocar em até 30 dias mas se não me encaixo em nenhum dos modelos pode ser que eu não exista pois é, meu amigo, você que me lê você não existe vamos desexistir juntos? renuncio à celebridade anônima aos meus dois cliques de fama por um abraço com gosto (mas, antes, preciso postar isso no Face!)

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

passa

não vou pela sombra
nada escondo
só ando caminhos ensolarados

não me interessa o frio
a luz me dá asas

tudo é passageiro
o amor é pa s s  a   g    e     m

segunda-feira, 29 de julho de 2013

presente

                                    ao meu avô

busco um cheiro que já não existe
sinto saudades de algo que nunca foi
pairo numa melancolia confusa
que farfalha sorrisos internos
imprevisíveis

de súbito, a vista da janela me desanuvia a mente
os pisca-piscas mal colocados
a televisão ligada na penumbra da sala
aconchego de porta aberta
me comovem

e o que me sobra é a presença do seu conforto
deslocada nesta cena
e nos meus olhos

quinta-feira, 18 de julho de 2013

a gente escreve

mesmo sabendo que jamais será possível passar em letras um décimo do que é viver, a gente escreve. pra registar momentos, pensamentos, ideias ou emoções. pra desacorçoar a alma, acalmar a mente e o coração. a gente escreve, porque coçam os dedos, porque palpita o corpo.

a gente escreve pra avisar aos desavisados que viver é perigoso, mas absolutamente imperdível e, mais, necessário, além de inevitável e inevitavelmente melhor que apenas olhar a vida passar – mesmo sabendo que não adianta o aviso.

a gente escreve, porque tem medo da morte, pra engrandecer a existência. escreve pra doer e pra sarar a dor, pro deleite e o desgosto. a gente escreve, porque tem fome de comer papel e vomita textos inteiros. escreve pra burlar o destino e reinventar passados. a gente escreve pra se isolar do mundo e se sentir menos sozinho. escreve pra esconder e jogar ao vento. pra dar vez à voz calada, esclarecer a voz confusa.

a gente escreve, porque lê, ouve e grita. pra crescer, entender, lutar, dançar, viajar e todos os outros verbos. a gente escreve pelos substantivos, adjetivos, advérbios, sujeitos e predicados. pra subverter a própria escrita. a gente escreve, porque tem o que dizer com silêncios. porque é inevitável e necessário. a gente escreve.

segunda-feira, 6 de maio de 2013

de boa com o boi


um dos maiores mistérios contemporâneos, na minha humilde opinião, é o demasiado incômodo das pessoas que comem carne em relação aos vegetarianos & afins não militantes.

veja bem, eu podia estar panfletando os malefícios do consumo excessivo de animais, ficar horas discorrendo sobre como a pecuária contribui para o efeito estufa, enviar as cenas grotescas do documentário “A carne é fraca” ou lotar seus e-mails com chantagens emocionais de bichinhos bebês insuportavelmente fofos suplicando piedade.

mas não. estou apenas aqui, na minha, de boa com meus vegetais, com muito amor no coração, sabor na boca e saúde nas veias. e, mesmo assim, sou obrigada a travar uma guerra diária para legitimar minha opção pessoal frente à sociedade, ciência, economia, deus e o cosmos com estudos certificados e firma reconhecida.

há, sim, muitas controvérsias sobre os efeitos do consumo de carne, para o bem e para o mal, e seria contraproducente tentar impedir este debate. nada contra os partidários do consumo do boi, muito menos do consumo com o boi. ambos têm o direito de se expressar e assumem a possibilidade de serem contrariados ao fazê-lo. a questão aqui é o incômodo exagerado com a simples existência de vegetarianos, mesmo que eles nunca falem sobre isso e até frequentem churrascos numa relax com seu pão & vinagrete.

a impressão que dá é que certos “carnívoros” concordam com a insustentabilidade ou os males do consumo de carne hoje, mas não estão dispostos a abdicar do prazer que sentem ao saborear uma suculenta picanha e, no fundo, sentem-se ligeiramente mal por isso. assim, veem os vegetarianos como pretensos mártires exalando sua suposta superioridade por se “sacrificarem” em prol do bem planetário.

pede até ser que alguns desses “herbívoros”, de fato, sintam-se assim, mas juro que não é o meu caso nem da grande maioria de vegetarianos, veganos e “simpatizantes” que conheço. não acho que minha opção por não ingerir animais vá salvar o mundo. não creio que, numa sociedade ideal, o consumo de todo tipo de carne deveria ser abolido por completo. acredito, inclusive, que há outros problemas alimentares tão preocupantes quanto a produção e o consumo da carne hoje em dia.

apenas sinto como a decisão de buscar uma alimentação com menos carne e mais natural revolucionou vários aspectos da minha vida e me fez perceber como estamos condicionados a padrões alimentares que, nem sempre, nos são benéficos, necessários ou saborosos. esta busca pessoal tem me levado a um incrível autoconhecimento em diversos níveis e me mostrado como é possível ter uma maior autodeterminação sobre meu próprio corpo e suas relações com a natureza. faz com que me sinta bem e livre.

isso é a minha verdade, faz sentido na minha vida. não acho que seja pra todo mundo e seria até estranho se fosse. não quero determinar o comportamento de ninguém, só o meu.

sei que outras questões envolvem inúmeras outras especificidades, mas o fato de eu não comer carne afeta quem come da mesma maneira que a aprovação do casamento gay afeta os heterossexuais: nenhuma.

não acho que tudo se resuma ao que vou dizer agora, mas: não sente atração por pessoas do mesmo sexo que o seu? seja hétero. não concorda com a ideia do aborto? não aborte. não curte maconha? não fume. acredita em deus? não seja ateu. apenas respeite a diversidade.

fica de boa aí com seu boi, que eu fico com meu mato. fechou?

segunda-feira, 18 de março de 2013

vista leve


na esquina em frente a esta janela, acontece de passarem personagens de outros tempos da minha vida. não se sabe ao certo identificar sua matéria: fantasmas, alucinações, fantasias ou coincidências. o fato é que tal fenômeno ocorre igualmente em outros lugares, mas tem esta esquina – bem no terceiro “ponto de ouro” do quadro fotográfico emoldurado pela janela do meu quarto – como palco predileto.

às vezes, são relances; noutras, cenas inteiras. agora mesmo, passou-me uma destas, com direito a subida da rua curva que vai desaparecendo atrás das casas do outro lado, até fechar a fotografia. um garoto nos seus dezoito anos passava carregando sacolas de supermercado - não tão pesadas que lhe dificultassem o andar, nem tão leves que não lhe delineassem, levemente, os músculos dos braços branquelos expostos pela camiseta regata. debaixo dela, uma bermuda de tactel de cores exoticamente descombinantes. sob um clima para roupas um pouco mais quentes, os chinelos de dedo e os cabelos meio bagunçados já quase sem corte finalizavam a aura de frescor que emanava naturalmente.

foi instantâneo o reconhecimento desse moleque, com quem vivi uma paixão adolescente leve e intensa como a descoberta do prazer. acho que jamais serei capaz de lembrá-lo sem sentir, como se fosse hoje, aquele susto fresco de hortelã. um suspiro completo conforta-me os pulmões, certo como o andar confiante e inseguro de quem se sente pronto e ávido por conhecer o mundo finalmente.

poderia, facilmente, viver nadando nessas memórias de tempos bons. acho até que nadaria em lembranças não tão boas e mesmo ruins – guardada uma segura distância temporal proporcional a cada uma delas. as emoções que sentimos ao longo da vida nunca param de nos emocionar, porém, guardado esse devido tempo particular, tornam-se memórias. e as memórias são feitas de outra matéria que não a do corpo. substância que pulsa entre coração e mente, muda de estado conforme o ângulo presente do qual a tocamos.

não é que se tornem fisicamente inócuas – muito pelo contrário -, somos nós que mudamos e o que nos fazia tal efeito já pode causar o oposto ao olhar carregado de tempo. assim como as células do corpo nascem e morrem a todo instante e já não há uma sequer que te componha desde o nascimento, também são vivas as células invisíveis das lembranças. somos algo transcendente entre esses dois tipos de células que é mutável como elas, mas mantém sua identidade em meio a esse caos natural.

é isso o que torna possível o passeio dessas memórias à minha janela. (ainda creio que, talvez, consiga tocá-las um dia).

mas o mais intrigante foi dar-me cara comigo mesma, noutra fase da vida, na dita esquina misteriosa. a primeira vez em que isso aconteceu foi também a mais arrepiante. meu avô havia falecido a menos de um ano e ainda me era extremamente difícil pensar em qualquer coisa que remetesse a ele sem ficar profundamente abalada, quanto mais enxergar a beleza daquelas lembranças. um belo dia, ao abrir as persianas de manhã, foi se desenrolando a imagem de um senhor à esquina com uma criança no colo. de longe, as cores me sinalizavam ser aquilo mesmo que me surgia à cabeça, mas tive que esfregar os olhos para enxergar os contornos. o senhor de simpatia contagiante segurava a menina de uns dois anos de idade virada para frente, para que pudesse admirar o movimento com ele.

era absolutamente inacreditável a maneira como aquela dupla, na simplicidade do seu contentamento, alegrava o ambiente ao redor. o corre-corre atribulado dos paulistanos matinais e seus veículos de pés ou rodas parecia até mais simples. ainda estava atrasada para o trabalho e senti uma vontade imensurável de teletransportar-me a mim mesma naquela cena e poder olhar o mundo com o coração daquela menina no colo do avô.

distraí-me por um minuto observando uns passarinhos que voavam entre as casas vizinhas e, quando voltei o olhar à esquina, a dupla já não estava lá. fui obrigada a voltar à vida presente, mas me senti alimentada por uma sabedoria milenar que só os avós emanam.

a segunda vez em que me vi à janela foi bem mais rápida. o intrigante era a curta distância de tempo que me separava de mim. uma menina nos seus dezenove anos corria em sua saia colorida e cabelos avermelhados ventando sua molequice. agarrada à bolsa de cadernos e tranqueiras para que não se perdessem no caminho, corria despreocupada e intensamente para alcançar sua aula de espanhol.

(bem desejei ver a Elvira, minha professora de espanhol com quem tive afinidade instantânea, à frente. contudo, acredito que ela não estava lá, porque o mais importante resultado daquelas aulas particulares – mais até do que o aprendizado do idioma – era as ideias que me despertavam e a maneira como me faziam sentir.)

o que mudou nestes quatro ou cinco anos – pensei –, se ainda tenho o mesmo comportamento de moleca quase toda vez que saio de casa atrasapressada, cheia de apetrechos confortantes e desnecessários?

talvez, a diferença seja o singelo e significativo fato de que agora me dou conta disso. quem sabe, meus passos já não voem tão leves quanto os dela, mas sinto que ganho uma leveza no olhar, cada vez maior, que me permite observá-la desaparecer, suavemente, entre as casas da curva, ao mesmo tempo em que me desfaço, conscientemente, nesta cena.



quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

dês


minha primeira desilusão amorosa me ensinou muito mais do que meus três primeiros amores – mesmo levando em conta a força avassaladora d’um amor primeiro.

se a gente prestar atenção, certas palavras nos explicam a vida:
desilusão tem a força de dez ilusões.

nós, poetisas e poetas, temos apreço pelas descoisas. talvez porque nos sobrem alguns parafusos e faltem juízos.

eu, por exemplo, tenho as palavras descalabro, desvario e desacerto como preferidas.

as descoisas têm mesmo a força de dez coisas. ou até mais. tente mensurar o desconhecido frente ao conhecido.

e se achou tudo isso um baita d’um descabimento desenxabido, seja mais descarada!